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José Bento dos Santos

Engenheiro e Cultor do Gosto

Qual é a sua ligação emocional a Cascais?
Desde que eu andava no IST (Instituto Superior Técnico) tinha colegas e amigos – o António Miranda, João de Deus Pinheiro e muitos outros – que eram daqui, de Cascais. Depois a paixão pelo golfe trouxe-me aqui ao Clube de Golfe do Estoril, há 30 e tal, 40 anos. Portanto, tive aqui uma ligação permanente e um conluio com toda esta região, com as suas potencialidades, com aquilo a que eu hoje me dedico tanto: a sua gastronomia, a praça de Cascais – eu vinha de propósito de Lisboa, à praça, para comprar os magníficos produtos que só há aqui.
Isso trouxe-me sempre uma ligação especial de muita proximidade a Cascais.

Hoje em dia o que lhe toma mais tempo? Ser gastrónomo, produtor de vinhos, ‘cozinheiro’, ou a atividade profissional como gestor/empresário (e broker) no setor dos metais?
Sou um cozinheiro amador, mas gosto muito de, todos os dias, se possível, treinar e fazer o meu jantar… Hoje essencialmente, a empresa continua a funcionar, tenho uma atividade nos vinhos, que é muito “a minha cara”, embora tenha o meu filho Francisco a tomar conta de toda a exploração, com uma equipa maravilhosa, na Quinta do Monte D’ Oiro - o que garante o funcionamento da quinta sem quaisquer problemas e com muito sucesso. Assim, pude dedicar-me a prestar quase um serviço cívico, relativamente a esta paixão da gastronomia, utilizando a oportunidade que foi dada pelo Turismo de Portugal – o programa Prove Portugal - a Academia Portuguesa de Gastronomia, onde sou presidente. Acabamos de produzir o Guia Galp, lançamos o slogan e fizemos o livro “Portugal - o melhor peixe do mundo”. Sou também presidente delegado da Academia Internacional de Gastronomia, ando pelo mundo inteiro relacionado com este fenómeno da gastronomia, da alimentação.
Inclusivamente há projetos aqui, para Cascais, no sentido de tornar esta área predestinada para o estudo do conceito do gosto. A Escola de Hotelaria e Turismo do Estoril tem condições e pode ser remodelada como um centro único, como já existe em muitos países, para que os problemas da gastronomia, da alimentação mas sobretudo o gosto sejam estudados. E se entenda a gastronomia mais como um conceito do que como um conjunto de receitas.

Pode revelar alguns dos projetos que haja?
Há apenas ideias embrionárias que derivam de se ter percebido que, em Portugal, a questão do gosto é muito importante. Hoje a alimentação é um problema transversal a toda a sociedade. Nós temos que ensinar as crianças nas escolas a comer e a ter gosto. Hoje nem os EUA conseguem suprir os orçamentos de saúde face à má alimentação das pessoas, o que dá problemas terríveis – mas não é proibir, é trocar por dietas melhores. Nós temos a felicidade de estar num país que tem o melhor peixe do mundo, que tem produtos diversificados, que tem legumes magníficos… Se os soubermos trabalhar, se não os reduzirmos a meia dúzia, temos uma profusão e encontramos nessa alimentação um prazer novo. Não temos que nos basear nos hidratos de carbono que nos fazem mal; podemos ir mais longe. Eventualmente, nesta comunicação – é isso que gosto de fazer – poderá haver uma oportunidade para fazer um novo programa de televisão, onde se chama a atenção para os produtos portugueses, a sua grande variedade e qualidade, e onde possamos melhorar a nossa saúde, as nossas crianças possam comer melhor, havendo menos obesidade e menos doenças relacionadas.


Os seus programas de televisão caraterizam-se justamente por um pendor pedagógico e cultural, onde se trata a gastronomia…
Exatamente. Alain Chapelle, um dos maiores cozinheiros do mundo, escreveu um livro magnífico onde dizia que a cozinha é muito para lá das receitas. É verdade: a receita é muito restritiva, o importante é conhecerem-se os produtos, as suas potencialidades, o que vai bem com o outro alimento - tal como quando nos vestimos e combinamos cores, para uma harmonia, de forma a sentimo-nos bem.… Ao nível da cozinha há menos tempo para estar na cozinha mas, com a facilidade de equipamentos e de matérias-primas que temos hoje, cada pessoa pode combinar melhor os seus alimentos.
As conferências e palestras que tenho feito são também sobre alguns aspetos específicos: por exemplo, falar sobre vinho e música. No ano passado no Porto, antes da Quinta Sinfonia de Mahler ser tocada, houve um programa em que as pessoas “provaram” a sinfonia: para cada andamento houve uma pequena prova de alimentos, que tinha uma relação. Também houve na Câmara Municipal de Lisboa, há pouco tempo, uma conferência onde através do Prelúdio nº 4 de Chopin foi possível as pessoas provarem vinho do Porto e comoverem-se… Perceber que o vinho do Porto não é uma descrição de que cheira a isto ou aquilo, mas é qualquer coisa que nos entra na alma e é uma emoção.

Com o seu conhecimento como engenheiro químico encontra algumas semelhanças nesse gosto com a gastronomia, produção de vinho, etc. – são como que alquimias, não?
Há processos químicos,… mas a grande transformação do cru para o cozido, são essencialmente processos físicos, trocas de calor - naturalmente que isso provoca nas proteínas processos químicos. Não que eu tenha aplicado mas pelo menos é-me mais fácil compreender. Nós hoje temos muito livro e muita ciência para perceber o que se está a passar, quando já fazíamos as coisas empiricamente. Hoje conhecemos os fenómenos e podemos melhora-los. Essa é uma realidade que está a ser difundida nas escolas e pelos cozinheiros profissionais…


Sempre teve esse gosto pela gastronomia? Quando era miúdo tinha o desejo de ser um chef?
Sempre gostei de liderar e, desde a infância, que gosto de ir para a cozinha e tenho interesse em provar, ter este sentido do gosto, equilibrar. Sempre que podia ia sabendo um bocadinho mais. É muito importante a tertúlia, conversar com amigos. Sempre que se conversa, e pode-se conversar com pessoas que não têm nada a ver, há algo que nos vão ensinando e mostrando que a cozinha vai muito para lá das receitas.


Cascais, na sua opinião, é uma terra já suficientemente conhe-cida fora do país? Qual tem sido o seu papel como “embaixador” de Cascais, no sentido da tornar esta terra uma “marca” visível?
Em termos gastronómicos, recordo que, há alguns anos, havia um número inusitado de pessoas que vinha a Cascais para jantar. Talvez hoje não se verifique tanto esse apelo. Mas isso era importante: é preciso fazer algumas ações nesse sentido. Cascais tem uma oferta de restaurantes magníficos e isso permite sonhar que Cascais possa vir a ser o cento gastronómico do país - através dessas poten-cialidades, da sua escola, dos chefs que já aqui trabalham, das pessoas que aqui vivem, mas também é preciso que isso seja sentido e assumido por quem está em Cascais e por quem visita. E parece-me que as condições são facilitadoras.


Aos 25 anos era selecionador nacional de râguebi e chefiava equipas de operários na CUF. Numa entrevista disse: “durmo pouco mas vivo permanentemente entusiasmado”. Agora dedica-se mais aos vinhos e aos livros. Começou cedo a ser um líder de equipas e agora aos 65 anos refreou esse ritmo?
Não. Sou um desassossegado por natureza. E continuo a viajar, muitas vezes vou e volto, não fico tanto tempo… mas continuo a viajar. Vou proximamente a Barcelona e lá irei à praça, com certeza. Desloco-me muitas vezes para ir ao tal local ou ao restaurante, ou a qualquer sítio que tenha relação com a gastronomia. Antigamente aproveitava viagens internacionais para fazer a extensão de um dia e ficar.


Tem saudades do râguebi ou transferiu esse gosto para o golfe?
São duas atitudes completamente distintas. O râguebi é um desporto completamente único. E toda a gente que jogou râguebi sabe disso. Durante a minha vida aconteceu a profissionalização do râguebi; mas entre o râguebi amador e o râguebi profissional há, de fato, uma grande barreira: manteve-se o espírito, manteve-se o conceito, a atitude das pessoas, mas a profissionalização – não diminui o fair play – trouxe para o râguebi a força, a potência com que hoje se joga.

E o golfe?
Continua a ser um desporto de exceção. Tenho pena que não esteja generalizada. Embora o golfe, para latinos, seja sempre um bocadinho problemático: porque a pessoa tem que assumir que o golfe é um jogo impossível! Falava há uns anos com um grande profissional e campeão, que me dizia: “mas eu, numa volta de golfe, se bater uma ou duas bolas daquelas que mexem o coração é tudo...”.


Também disse que a reforma não lhe assenta bem. E chegou aos 65 anos…
Cheguei aos 65 anos formalmente. Acabei de me reformar mas, há uns dias estava com o meu médico e tinha-lhe transmitido isso. Ele deu um pulo da cadeira e disse: “Mas você não se pode reformar!”.
Reformei-me mas estou com muita vontade de fazer muita coisa. Sobretudo agora, que sou avô de um neto pequeno, não só para ele mas para outras crianças, tenho muita vontade de ensinar-lhes a questão do gosto, da música, da cultura, da pintura. Transmitir a crianças este saber acumulado, que é a única coisa que eu hoje posso fazer: transmitir algum deste saber acumulado a terceiros.

Cascais Digital

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